Livro do dia: O urso e o gato-montês

Livro do dia: O urso e o gato-montês

Posted by Kátia

A perda do melhor amigo deixa marcas profundas na vida de qualquer pessoa, e o que dizer então de um urso cujo destino sempre esteve ligado ao de um simpático passarinho? Com a morte de seu amigo, o urso perde o chão, o rumo e a vontade de viver. Esculpe uma caixinha de madeira para ele e a pinta com o sumo das frutas silvestres. Decora-a com flores aromáticas e coloca o amigo carinhosamente lá. Mas não consegue se separar dele. Passa a vagar sem muita consciência pelo bosque, sempre com a caixinha nas mãos, a recordar os dias felizes que viveram juntos.

Ele chora e sofre, e segue caminhando com a caixa. Os outros animais do bosque ficam curiosos sobre o conteúdo dela, e, constrangidos, dizem apenas que ele deve esquecer. O urso vai para o seu refúgio, e de lá não quer mais sair. Dias e noites se passam e o urso permanece no interior de seu quarto escuro. Ele dorme e acorda, dia após dia, na mesma cadeira, o silêncio corroendo seu coração partido. Mas de repente ele abre a janela, e é saudado pelo sol e pelo vento, que lhe traz um delicioso aroma de relva. Ele finalmente sai de casa e olha o céu, como se fosse a primeira vez.

O urso caminha e caminha, subindo o barranco à margem do rio. Lá, estirado ao chão, um gato-montês tira uma bela soneca. Uma caixa de madeira de formato sinuoso chama a atenção do urso e ele tenta iniciar uma conversa com o gato, depois de tanto tempo sem emitir uma única palavra. O gato, com jeito preguiçoso e atrevido, concorda em mostrar a caixa para o urso, desde que ele mostrasse a sua misteriosa caixinha primeiro. O gato-montês admira o passarinho por um instante, então mostra a caixa de seu violino e toca uma música em homenagem aos dois amigos.

A melodia evoca os momentos inesquecíveis da amizade do urso e do passarinho. O urso lembra-se de uma ocasião na qual o passarinho foi atacado por uma doninha e perdeu as penas da cauda. Pacientemente, o urso cuidou dele e depois reconstruiu sua cauda com folhas e laços. Ele ainda conseguia se recordar da expressão do passarinho ao se virar para ver a nova plumagem. O urso sorri com a lembrança. Uma a uma, todas as coisas divertidas que fizeram juntos passam por sua mente. Os banhos na fonte do bosque, a brincadeira de contar os frutos das árvores (o passarinho era sempre mais rápido), a sensação de cócegas quando o bico do pássaro tocava a sua testa para acordá-lo todas as manhãs. Então, o urso decide definitivamente espantar a tristeza de sua vida, porque “eu e o passarinho seremos amigos para sempre”.

O gato-montês, que ele já considera um novo amigo, fica ao seu lado durante o ato final de separação. E ainda lhe faz um convite que mudará sua rotina e o levará para lugares desconhecidos e fascinantes, a fim de encantar todos os seres  do mundo através da música. Eis aqui um delicado conto japonês que trata de um de meus temas preferidos, a perda, ilustrado esplendidamente com muito drama, em tons escuros que aos poucos, bem aos poucos, ganham pinceladas de um rosa suave. Como que convidando à renovação e à descoberta de novas formas de felicidade. Precioso.

O urso e o gato-montês
Autora: Kazumu Yumoto
Ilustradora: Komako Sakai
Editora: Brinque-Book
Temas: Amizade; Perda
Faixa etária: À partir de 07 anos

Leia também: Ambientado numa casa “tão quieta agora como jamais esteve”, o fabuloso livro My Father’s Arms Are a Boat (Enchanted Lion Books) fala sobre a relação de um afetuoso pai e seu melancólico filho, que tentam a todo custo superar uma grande perda. Com ilustrações em 3D tão maravilhosas quanto o texto, o livro dos noruegueses Stein Erik Lunde e Øyvind Torseter nos faz chorar e suspirar.

"Tudo ficará bem", disse o Papai.
MyFathersArms4.jpg